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Não é isso que se espera e queremos para a Perícia Médica

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Não é isso que se espera e queremos para a Perícia Médica

Female doctor typing on computer

A Justiça Federal do Paraná publicou recentemente edital para Cadastramento e Seleção de Peritos Judiciais.

Até aí, nada de novo, uma vez que estes editais são comuns nos mais diferentes Tribunais Federais. Contudo, vejo com preocupação material que estaria sendo enviado aos médicos para esclarecimento de como “funciona” a atuação do Perito Judicial em ações previdenciárias. Recebi este documento através de grupos de WhatsApp e parece estar sendo enviado realmente. Torço, com todas as forças, para não ser verdade.

O documento supostamente enviado em pdf, com duas laudas, traz algumas perguntas e respostas sobre a atuação como perito judicial na Justiça Federal em ações previdenciárias. Em determinada pergunta temos o seguinte conteúdo:

Que tipo de laudo é preciso emitir e de que forma?
Os laudos periciais médicos do Setor são elaborados de forma eletrônica, através do cadastramento pelo perito no sistema e-proc (processo eletrônico), disponível 24h por dia e 7 dias na semana, e que podem ser preenchidos de qualquer local.
Os quesitos são padrão para todos os processos, e devem ser respondidos com base nos dados da perícia médica administrativa realizada pelo INSS, dossiê médico previdenciário anexado no processo eletrônico, documentação trazida pela parte (atestados médicos, exames, prontuários, CTPS e demais elementos) além do exame clínico, quando necessário.
Atualmente, a Justiça Federal realiza também a prova técnica simplificada, em substituição à prova pericial, nos termos do art. 464 §2o e §3o e art. 472 do CPC; art. 35 da L. 9.099/95 e art. 12 da L. 10.259/01. Trata-se de um parecer técnico realizado sem o exame presencial ou físico do periciando e onde o perito judicial esclarecer sobre pontos relevantes da perícia realizada na esfera administrativa, cotejando-a com os documentos dos autos e dados técnicos.

Dois aspectos neste trecho chamam a atenção e devem ser objeto de especial atenção de toda a comunidade jurídica:

  1. A relativização do exame clínico na prova pericial e a colocação da prova técnica simplificada como alternativa, em substituição a pericia médica;
  2. Afirmação de que os quesitos são padrão para todos os processos.

Como já havíamos destacado em todas as discussões que participamos sobre a chamada “telepericia”, os advogados deveriam ficar atentos a relativização do exame clínico, em especial o exame físico, um pilar da prática médica pericial.

Antes o “exame físico” não deveria ser realizado porque o COVID-19 não permitia as perícias presenciais, agora já temos documentos sendo enviados para médicos “candidatos” a peritos afirmando que ele não é necessário em todos os casos. Daqui a pouco, talvez, o exame físico seja proibido!

Estamos falando de um documento que estaria sendo enviado para candidatos a credenciamento para atuar como peritos judiciais em ações previdenciárias, no qual o exame físico é colocado como algo secundário, nem sempre necessário.

Desde o início desta discussão sobre “telepericia” estamos alertando a comunidade jurídica, toda vez que participei de debates sobre o tema joguei luz nesta questão: como será o “pós pandemia”? Serão medidas pontuais ou a “telepericia” será institucionalizada?

Acho que está pergunta acaba de ser respondida por este documento ou, pelo menos, temos um indício de sua resposta.

Ao relativizarmos a importância do exame clínico e, consequentemente, do exame físico, traremos grande prejuízo a produção da prova pericial, que passará a ser totalmente indireta, através dos documentos apresentados.

Quem será prejudicado? O jurisdicionado!

Ao invés de lutarmos para que a perícia médica tenha uma maior qualidade, estamos aceitando e concordando que ela seja realizada sem respeitar a técnica adequada, sem que seus métodos sejam atendidos.

Tal prática contrária o artigo 473 do CPC, que indica requisitos processuais para a aceitação do laudo pericial, dentre eles que o método utilizado pelo perito seja aceito pelos especialistas na área do conhecimento.

As entidades médicas já se pronunciaram e entendem a prova pericial sem exame físico como inviável tecnicamente para avaliação da incapacidade laborativa atual.

E pior, o documento que estaria sendo enviado aos médicos “candidatos” a perito judicial indica que os quesitos são “padrão” em todos os processos.

Qual a leitura que eu faço desta indicação? Que está sendo afirmando que os quesitos elaborados pelo Autor não têm importância e não devem ser respondidos.

Quando a própria Justiça Federal supostamente afirma para “candidatos” a perito judicial que os quesitos são padrão em todos os processos, algo está muito errado.

A parte Autora não tem direito a fazer quesitos? O perito judicial não está obrigado a respondê-los?

Estamos tratando do princípio da ampla defesa e do contraditório, algo que não pode ser atropelado ou deixado a segundo plano.

Os médicos, em sua maioria, não têm formação jurídica específica em direito processual e estariam recebendo informação da própria Justiça Federal que os quesitos são “padrão” em todos os processos.

Isto quer dizer que os quesitos da parte Autora não são importantes? Como podemos exigir dos peritos judiciais respostas aos quesitos da parte quando a própria Justiça Federal estaria enviando para médicos, que sequer começaram a atuar, tal informação?

Entendo que este documento deveria ser revisto pela Justiça Federal do Paraná, caso tenha sido realmente enviado, uma vez que a prova pericial deve ser tratada com a devida atenção e importância. Com todas as vênias, é inconcebível que se inicie um credenciamento de peritos com essas informações.

Alertamos a todos sobre o prejuízo que a aceitação de provas periciais sem respeito a técnica durante a pandemia poderia trazer no futuro. Felizmente ou infelizmente, os fatos se sobrepõem ao discurso.